terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Entrevista a Cosme Damião IV

Segue a continuação da entrevista a Cosme Damião (Parte I, Parte II, Parte III).
Neste post é dada por concluída a entrevista. No próximo post publicaremos os textos e imagens que completam este artigo, por ocasião do 41º aniversário do Sport Lisboa e Benfica.




A saída para o Sporting

A dar força às suas observações, a tornar mais imperiosa a necessidade de campo, havia o exemplo do Campo Grande, transformado, pela força de vontade de José Holtreman Roquete (Alvalade), no Sporting Clube de Portugal, com campo e instalações decentes. O exemplo começou a tentar... Não se podia fazer nada sem campo.
Houve troca de impressões entre os jogadores. E chegou-se  a uma conclusão desoladora, não havia campo e não se podia passar sem ele. Resolveu-se, por acordo, que cada qual procurasse a solução que mais lhe agradasse ou a que melhor se pudesse adoptar. Um, quási todos os jogadores da primeira categoria, foram para o Sporting, permitindo a José Machado a realização do seu sonho de um grande clube. Com aquele reforço, o Sporting organizou o seu primeiro «team» da categoria superior...
Dos outros, uns juntaram-se ao Académico, de onde era figura saliente Vergílio Bentes, feito jogador na Casa Pia. Alguns fizeram-se sócios do Sport Clube Benfica, que também tinha campo, em Benfica. Surgiu entretanto a ideia de resistência. Marcolino Bragança, jogador esplêndido, talvez por aspirar justamente a alinhar em primeiras categorias, pôs este problema - porque não passamos o segundo «team» a primeiro? Concordaram alguns. Eu, por mim, concordei. Marcolino Bragança foi a «alma» da resistência. Perdeu o ano no Liceu. Mas ganhámos todos - com a continuação do clube.
A impressão no meio desportivo da época era de que o Sport Lisboa morrera. Quando se fez uma reunião na Liga Naval, para inscrição do clube, foi com surpresa que se viu José Silvestre da Silva, como representante do Sport Lisboa, a assegurar a inscrição do clube.
O Sport Lisboa não sucumbiu. Um dos elementos que saiu para o Sporting, o Henrique Costa, voltou, um ano depois, não obstante ser presenteado com um relógio de ouro, como jogador mais correcto em toda a época. Voltaram outros. Mas voltou, sobretudo, o entusiasmo dos primeiros tempos. E o Sport Lisboa manteve-se. E está aí grandioso, cada vez mais forte.

Um campo salvo por duas «sopeirinhas»

Nesta altura somos nós que interrompemos o fio das recordações do Cosme. A esposa enfermeira dedicadissíma do seu marido, chamara já a sua atenção para a hora de qualquer medicamento. Desculpa Cosme, dizemos nós. Estava gostando de te ouvir e penso que te agradava a recordação do teu passado desportivo. Mas não quero maçar-te.
- «Não, não me maças. A recordação agrada-me ao meu espirito», responde.
-Então, só uma pergunta, para fechar a entrevista: há algum episódio  de dedicação relacionado com a continuação do clube?
O Cosme hesita um pouco, mas volta com pretexto:
- «Aí vão dois, à falta de um... E um deles liga-se com a acção desenvolvida no clube pelo actual sócio nº 2 - Luiz Carlos de Faria Leal.
O caso passou-se depois de estarmos em Benfica, após a nossa fusão com o Sport Clube Benfica para onde passámos com cerca de 50 sócios. O campo custava-nos 45.000 reis de aluguer por mês. E não havia dinheiro que chegasse. Que se há-de fazer? perguntavamos uns aos outros, num grupo de sócios com mais responsabilidade. O Faria Leal deu a resposta. Agarrou em duas «sopeirinhas», títulos que valiam 22.500, naquela altura. Agarrou neles. Foi vendê-los. E trouxe-nos integralmente os 45.000 da venda! Estava salva a situação!
A evocação da falta de pagamentos faz-me lembrar uma outra situação difícil, certamente a mais penosa que o clube atravessou. Estávamos também em Benfica, alguns anos mais tarde, na Avenida Gomes pereira. Houve quem deixasse propositadamente de pagar água, luz e não sei que mais. Mas igualmente houve quem nos avisasse do que se passava. E pagou-se tudo. O clube voltou a salvar-se. Este caso é, porém, mais complicado. Talvez merecesse a pena contá-lo com vagar».
Às vezes, são os entrevistados que se calam, a despedir jornalistas. Um silêncio destes chega a ser significativo... Desta vez, dá-se o contrário. É o jornalista que tem de impôr o descanso ao entrevistado. A conversa era atraente. Mas não tínhamos o direito de abusar da hospitalidade com que o Cosme, o «velho» Cosme do Benfica, nos recebera. E a nossa demora fazia retardar o tratamento.
Agradecemo-lhes a forma como nos atendeu. Mas cumpre-nos agradecer também à sua esposa e filha a gentileza com que nos permitiram conversar largamente com Cosme Damião. Para todos, vão os nossos desejos de melhoras.


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